quinta-feira, 20 de agosto de 2015

36.

«A casa dele não tinha nada, só água e vinho engarrafados, velas e candeeiros a petróleo. A casa de banho era um género de torre, lá fora, alta, parecia a torre de vigia de um forte medieval, ou então aquelas torres romanas no Asterix, havia um banco, onde te sentavas, e era o da sanita, tudo a céu aberto, maravilha. Cagar a ouvir os pássaros e a ver o campo. Depois havia ganzas a monte. O Saul estava sempre a dar bafos no seu cachimbo de água e era um bacano porque representava sempre, sempre. Dava um bafo e passava-to logo. Andava sempre com a touca e eu também nunca vi ninguém ao pé dele que não estivesse com a touca...»
Ricardo, envergonhado, bateu-lhe forte na perna. Apesar de tudo e de todos os atenuantes aquilo não era conversa para se ter na polícia. Rómulo não estava minimamente chocado - nem sequer Carlos Silva -, do mais, como homem das ruas, sabia do jargão todo e mais algum. Também já lhe acontecera ter de dar bafos em cachimbos de água. Coisas do jogar infiltrado.
«Continua Marco. Estávamos a gostar de ouvir.», disse Carlos Silva.
«Não volto para lá. Não dou mais para aquela maradice.»
«Explica lá melhor o que era a maradice?», perguntou Rómulo.
«A maradice era a quantidade de droga que os freaks tomavam. E ácidos e quê. Alguns eram mesmo marados. Houve uma vez em que um teve os velhos a virem da Alemanha para ali só para o irem buscar. O chaval já tinha quarenta anos. Há mais cerveja?»
Carlos Silva deu-lhe uma lata de cerveja. 
«Depois havia os mamados. O Saul também era um bocado mamado, se bem que o Saul é outro andamento, outra onda. A mulher dele é que era completamente mamada.»
Riram todos. Sabiam o que o Marco queria dizer, mas não puderam evitá-lo. Mamado pela língua estava ele. E Carlos Silva entrou ainda mais por ali adentro:
«O que é o Sr. Marco quer dizer quando diz que a mulher dele é completamente mamada?»
«Mamada quer dizer agarrada. Viciada em heroa, quer dizer, em heroína. Desculpem.»
«Não ligues a advogados, continua.», disse Rómulo.