terça-feira, 13 de agosto de 2013

GUADALCANAL

A Batalha de Guadalcanal pode ter sido muito importante na Segunda Guerra, não duvido, só não se pode é comparar a outras bem mais sangrentas, aterradoras e destrutivas o suficiente para não ficar pedra sobre pedra, muito menos imagens e histórias para contar.
De Guadalcanal ficaram documentos, relatos, fotos, filmagens, livros de história e romances. Nestes o maior destaque vai para "The Thin Red Line" de James Jones que além de soldado também era escritor e fez do inferno de Guadalcanal a segunda parte da sua Trilogia da Segunda Guerra Mundial*. O escritor pôde transpor para livro muito do que aconteceu e vivênciou. Décadas depois surgiria daí uma obra-prima para a História do Cinema. 

Volto de quando em quando à barreira invisível de Terrence Malick. Não existe tal coisa como o melhor filme da vida, no entanto, por várias razões que não vêm ao caso, devo dizer que "The Thin Red Line" de Terrence Malick é o filme da minha vida. Vi-o mais de vinte vezes, apenas três em sala, digo apenas porque a primeira vez foi no ultimo dia de visionamento e querendo revê-lo só o consegui anos depois na cinemateca para onde voltei outra vez outros anos depois. Sinto-me pois auto-autorizado a dar crédito à minha visão destes trinta segundos de documentário**, qual 
flashback, três planos que são o lado real de muito do que vi naquelas vinte e tal vezes. Pensei "é isto, é mesmo isto!". Imagino que foi por imagens destas que Malick dava cabo dos actores com takes atrás de takes que os atiravam às cordas. 

Do mais, nunca encontrei batalha na Segunda Guerra Mundial com o mesmo peso de metáfora, de capacidade de resumir tudo numa imagem, uma imagem que consiga contar uma história, uma imagem que encerrada de tal forma em sua redoma, consiga fechar o seu próprio círculo. Do que se vê, mais do que se sabe, Guadalcanal é o rosto daquele soldado a tal ponto desesperado que, no limite, pode chegar ao auto-desvanecimento - já não saber bem onde está, do porquê de estar ali, de lhe restar apenas o absurdo. É onde fica a barreira invisível, naquela estranha atmosfera hostil,  infestada de insectos, répteis, vírus, charcos, selva, canaviais. Onde o próprio tempo pode ser um inimigo maior que o inimigo que nos combate, quando tudo de dissipa como a luz num Buraco Negro.  

Lembro a reacção pouco entusiástica de um amigo meu na altura. A minha surpresa vinha mais de ele ter bom gosto cinéfilo e gostar de alguns grandíssimos filmes e cineastas. Mas adiante. Justificava ele o cepticismo, que "as coisas não se podem pôr assim desta maneira". Foi objectivo, talvez porque os japoneses estavam do lado errado da barricada. Não via o óbvio mesmo à frente do nariz. Por exemplo que se tratava de uma reflexão sobre a guerra, mais que um filme de guerra, que Guadalcanal era tão só o perfeito "ponto de cozedura". 
Tenho para mim que Terrence Malick não poderia fazer uma obra assim sobre o Vietname ou qualquer outra das guerras injustas. Onde é que encontraria aí o ponto? Onde ilustraria melhor a solidão do soldado moderno tão cara ao autor do livro? Onde é que melhor poderia encontrar a linha ténue, a barreira invisível? 

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* - "From Here To Eternity" sobre a vida na tropa, Pearl Harbour, o soldado Prewitt (o Witt de Malick, o espantoso Jim Caviezel) e a sua recusa em juntar-se à armada. "Thin Red Line". "Whistle" sobre o regresso, a convalescença e as marcas da guerra. 

** - A partir dos 36:48, a sequência e as imagens.