domingo, 11 de maio de 2014

18.

Acordar com a Canção de Lisboa de Jorge Palma na cabeça é coisa que promete pouco. Do mal o menos, irei escrever. Na verdade estou mesmo a escrever agora neste bloco apanhado da mesinha de cabeceira. De certo só mesmo aferir da chama com que me deitei numa noite de palavras decididas. De incerto nada remanesce e arrasta a areia e prova-me a caneta que acordei desafinado. Então subo o volume ao grande Jorge Palma, trazido da melancolia da noite para o dia, o que também é certa decepção de mim próprio: penso em todas as palavras que não li subtraídas ao tempo que as tive para ler. Penso em marimbas no fundo da cabeça que a páginas tantas se nos oferecem no extraordinário Suicidas de Henrique Manuel Bento Fialho. Vá lá que aqui está tudo intacto, nem que seja na aparência. Sei que houve resistência para a avidez das tropas inimigas, hoje mais ávidas que nunca. A gente perde o rasto aos colegas do recrutamento obrigatório. Não me lembro de haver amigos na trincheira. 

segunda-feira, 5 de maio de 2014

17.

- Levar-se a sério é sinal de avanço. Não se levar, sinal que se avançou. 

- Devagar se vai ao longe, à velocidade da luz o tempo pára. 

- A liberdade precisa das mãos, as mãos precisam da forma. 

- A falsa amizade? Uma desculpa para, um encolhe-te, um prende-te, um as coisas não podem ser assim dessa maneira. A dependência. A pressão alta e a marcação ao homem e à zona. As almofadas. A maquineta de jogos de manipular. A carapuça das aspas acima da palavra. 

Carne para Canhão

Não deixa de ter semelhanças a inconsciência que nos atirou para esta absurda austeridade e perigosa divisão da Europa entre norte e sul, com a inconsciência que precipitou os acontecimentos na Praça Maidan, usando dos piores defeitos da propaganda para esconder o mais puro fascismo doutrinário e um Golpe de Estado contra um governo legitimo e democraticamente eleito. 
De tudo o que eu vi na altura em entusiasmados noticiários, nada mais recordo que a exibição das colossais riquezas à base do roubo, sim, de um governo ladrão e corrupto. Com os palacetes e demais iguarias ficávamos conversados: o governo não só era corrupto, era mais que corrupto, vergonhosa obscenamente corrupto, e a golpada até nos parecia legitima, enfim. Era o povo e tal e nós isso mesmo: burros a olhar para o(s) palácio(s). Problema veio depois. Outros também quiseram, com a verdade - que como Nietzsche dizia, não é propriamente uma velhinha indefesa - de o quererem muito mais legitimamente, fazer também a sua revolução. A começar com a Crimeia, que não foi há dez anos. O resto da história todos já conhecem, ou melhor, vêm conhecendo, de preferência não pelo José Rodrigues dos Santos, que teve na Ucrânia um dos piores e mais parciais exercícios jornalísticos de um enviado especial que eu vi em vida. Agora, enfim, agora é como alguém do mais credível escreveu:«Estamos dependentes da sensatez, ou falta dela, da Rússia». O que até pode ser traduzido por um agora aguentem-se à bomboca. No que é melhor não ser ingénuo. Vou até mais longe, acredito que tal como fomos atirados para esta crise pelos mesmos que tudo dela lucram, poderemos ser atirados para a guerra como povos inteiros antes o foram em tempos de crise. Podemos sempre confiar que a razão estanque a hemorragia das feridas abertas em tempo recorde - e as marcas das feridas têm sido deveras reveladoras. Problema é que a razão não tem sido pródiga em qualquer das partes interessadas. Falemos nos Estados Unidos, é desnecessário de tão óbvio enumerar todos os seus interesses económicos, financeiros, políticos e geoestratégicos (já para nem falar no "military-industrial complex" que só não vê quem não quer ver) em todo este absurdo. Quando a Rússia é o velho patriotismo do Império Russo e Vladimir Putin é Vladimir Putin. Quando a União Europeia é toda esta ordem sem ordem às ordens de Berlim. Talvez eu ande mesmo desmemoriado, mas agora assim não me recordo de nenhuma guerra justa que meta estas gentes e estes povos desde a Segunda Guerra Mundial. Causada por esse Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães que era nazi e fascista e tudo, não era? E o fascismo, nazismo, ou pelo menos, vá-lá, o mais feroz nacionalismo também hoje é parte deste incendiário ilegítimo governo da Ucrânia, não é? Da Europa-América até já aterrou o FMI em Kiev (como aconteceu no Iraque, nunca vi comentador e/ou analista falar nisso, os comentadores e/ou analistas nunca falam na Doutrina de Choque), não foi? Os Estados Unidos e a União Europeia só estão mesmo preocupados, seriamente preocupados, com a democracia, a justiça e a integridade territorial da Ucrânia, não é? Problema que tudo tenha apenas começado

sábado, 3 de maio de 2014

Maio Maduro Maio

Foi instrutivo, não intrusivo. Estavam lá os grupos, grupelhos, fainas, arquitecturas, engenharias. Uma pipa de massa à base de fígado. Uma boa dose de confiança. Também foi fácil dirigir-me à verdade, era só contornar algumas pessoas. Sujeito a quem se pedem predicados, aos outros eu sujeitos só mesmo trabalhando em equipa e/ou contextos de amizade. Géneros de coisas das quais não se pede e só mesmo por acrescento. Nada de guerras, só textos. Com uma população a desaparecer por falta de alimento ao espirito, cheguei ao ponto mais ocidental de mim próprio, logo ali desatei a ler. Já não tinha nem tropas nem aldeões e foi difícil  reiniciar-me com pedras a atacar o estômago. Mas ganhei fôlego. Livros, minha intuição tinha-os fisgados mas foi como conhecer um país estrangeiro que sabíamos extraordinário quando ainda não o tínhamos vivido. Tomos na desordem ordenada como um atelier de Picasso. Esquecido perdido nem reparava no trabalhado e por trabalhar. Detesto o nome laboratório de ideias, é feio vulgarizar assim a palavra através da ciência. Com o seu quê entre o jargão de telejornal e o de criativo publicitário que em tudo me irrita ao ponto do deixem-me em paz. É como o intragável presunção de inocência que não é coisa com coisa e tudo reclama e tudo acusa. Quem se terá lembrado de semelhante ideia? Horas e dias de reflexão e fugas e batalhas contra essa sombra desconhecida só podiam ter dado este resultado: o problema não é meu. 
Seja, certos territórios, estranhas ilhas desconhecidas, estão disponíveis atrás do arvoredo. Desancorar, assaltar armadilhas. Partir do sentimento, não tanto do aperfeiçoamento.